Major Pachanga
Toda a minha vida tive a impressão que os militares são seres duros e rígidos. A masculinidade que lhes é devida aparece intrinsecamente associada, sem haver qualquer espécie de dúvida, ao olharmos de baixo a cima um indíviduo de verde vestido, pistola no coldre e bota pesadona, manejando como ninguém a arma que lhe foi entregue. Ver um militar a conduzir uma chaimite traz-me à memória imagens românticas do Salgueiro Maia, a entrar em Lisboa, com aquele ar confiante, mas seguro da sua heterossexualidade, enviando beijos às miúdas que gritam á sua passagem.
No entanto, depois de alguns poucos dias rodeada de pessoas cuja única cor de indumentária é o verde tropa (o chamado síndrome Turma da Mônica ou falta de imaginação, se quiserem), a minha opinião mudou radicalmente.
Os seres duros e rígidos gostam de ouvir Bach e ler Schopenhauer. Os seres rígidos e duros apreciam películas como Profissão: Repórter, de Antonioni (que eu aliás, devo dizer, não gostei muito -- perdoem-me os cinéfilos amigos). Os seres másculos e treinados para combater são pachangas. Não acreditam???
Estava eu em Figo Maduro, no regresso da minha trip-à-tropa kosovar, quando o meu telemóvel tocou. Perto de mim estava um Major cujo nome não poderei pronunciar, com quem criei alguns laços de convivência bastante cordiais. Como sabeis, amigas, de meu aparelho de comunicação emana a fantástica e inconfundível música do "Sexo e a Cidade".
Major- Ohh isso é do Sexo e a Cidade!!! Gosto muito, tenho todas as séries!! (ler com entusiasmo)
Eu- ???????? ehhhhh... pois é... também adoro. Também tenho as séries todas... (lanço um olhar céptico e confundido ao militar de alta estatura)
Major- Então e com qual das personagens se identifica mais? (jovial e comunicativo)
Eu - (olhar de pânico, enquanto corro as características das quatro personagens, estereotipando ainda mais cada uma delas como a slut, a púdica, a romântica e a pragmática, não sabendo muito bem qual escolher, de forma a não fazer figura de slut, púdica, romãntica ou pragmática em frente ao senhor) - Ahhh, as personagens são um bocado exageradas, ah e tal, aquele estilo de vida delas não existe, como é que uma rapariga que escreve uma coluna pode comprar manolos todas as semanas, ah, mas acho que me identifico mais com a Miranda.... a advogada.... (Mentira, penso. "Ainda por cima a gaja é lésbica!! Foda-se!!" )
Mas a merda da tendência pós feminista vem ao de cima e esta foi a resposta possível. Não podia ser Samantha, sob pena do homem pensar que eu fodo tudo o que se mexe. Não podia ser Charlotte, porque o folho e o rosa nada têm a ver comigo. A Carrie seria demasiado canosa, já que é a tótó do grupo. O senhor militar percebeu que eu mentia e aconversa ficou por aí, depois de ver o meu ar atabalhoado. E não disse nada, ao bom jeito de um cavalheiro.
O que não ficou esclarecido depois destes dias foi se o Major conhecia o Dirty Dancing... Mas eu não desisto. Até porque a resposta está a um telefonema de distãncia...
7 Comments:
Minha cara,
a tua senda de busca de buracos negros na heterossexualidade de cada homem que conheces anda a toldar-te o juízo. Devo interpretar como menos másculo um tipo gostar de Schopenhauer, Bach ou Antonioni? Acho que ir por aí é comprar chatices na tua própria rua, e não me parece que estejas disposta a isso.
Já o Major... bom... Não é que... enfim, como dizer isto? Eu apostava mais que o tipo acha que papa gajas assim, do que o gajo ser pachanga. Acho no entanto bem feito, para as gajas em geral, que existam gajos assim. Tantas tretas ouvimos durante anos de inteligências emocionais e o diabo a sete, que algumas mentes mais frágeis adoptaram a postura 'sensível'.
Levem vocês com eles, que com a gente não vêm esses meninos mamar imperiais e falar de mamas.
Sérgio
Boa amiga,
Para mim os militares são camiões carregados de esterco, que apitam sonoramente e estão em constante excesso de velocidade. Quanto mais alta é a patente, mais merda levam. Não gosto deles, mas haverá, certamente, excepções que podemos apreciar.
Esse major é metrossexual, ou seja, transporta a mesma merda, mas a merda cheira a rosas. Ou então é extraterrestre.
Gostava de te ver partilhar um comboio com militares e manteres esta opinião...
Eu, por motivos vários, não partilho da vossa opinião sobre os militares. Estão a esteriotipar pessoas que, como em todo o lugar e profissão, há para todos os gostos. É como dizer que todos os jornalistas são convencidos e narcisistas, e todos os homens do lixo cheiram mal e são ignorantes. As mulheres, mais do que ninguém, deviam perceber que os esteriótipos não são bons, nem são justos. Minha cara Alice, há 50 anos atrás, a sua avó não podia opinar por causa dos esteriótipos. Hoje, felizmente a Alice tem direito à sua opinião. Não a dê de animo leve, pois pessoas lutaram para que tenha direito a ela. E que me lembre, foram militares.
Estás lá
"Se a liberdade significa alguma coisa, será sobretudo o direito de dizer às outras pessoas o que elas não querem ouvir."
George Orwell
A avó da Alice já vota desde 1931.
E esta avó não sabia apenas ler e escrever.
Em 1935 já outras avós eram deputadas à Assembleia Nacional.
Há mais ou menos 50 anos, outras tantas avós escreviam livros e faziam exposições em colóquios e sessões de discussão por se oporem aos estereótipos.
Considera mesmo que as pessoas que lutaram para que a Alice e a avó tenham opinião foram os militares? Acredita de ânimo leve em tudo o que lhe contam sobre o nosso passado recente?
Imagine: os estereótipos estarão para as mulheres como a liberdade nunca estará para os militares. Se pensar melhor, vai ver que discorda de si.
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