Wednesday, April 02, 2008

Gente aborrecida

Raras vezes dou-me ao trabalho de juntar o dia a dia do meu trabalho com a causa pachanga. E olhem que possibilidades as há.

Fazer jornalismo sobre música tem logo à partida uma condição que afasta essa ideia geral de que é um trabalho fácil sobre uma coisa que se gosta. É ter que conhecer ou falar com muitas pessoas que nos habituámos a admirar à distância. Correndo o risco de tocar os píncaros da prepotência, confesso que a maior parte das vezes levas em cima com um belo balde cheio de desilusão.

Como confessa fã de músicos tenho que dizer que a maior parte são uns chatos do caraças. Curioso que as melhores surpresas venham com aquela malta que faz ... como hei-de dizer isto... música de merda. A maior parte são simpáticos e acessíveis. Quase como se quisessem compensar a óbvia falta de talento. Pois é tudo muito bonito, mas não apaga o facto de fazeres... música de cócó.

Os que em escuta mostram talento, apareceram-me, na minha parca experiência, de variadas maneiras: a) com uma ressaca do tamanho da Rússia nos cornos, b) com uma tola do tamanho da Austrália no sistema central, c) com um pau enfiado até ao lóbulo frontal, d) a comprar fruta ou outra actividade neutra aparentemente mais interessante do que responder a questões sobre a TUA MÚSICA e e) chamas-te Peter Murphy e dás um banho de profissionalismo aos outros todos.

E tudo isto até se suporta bem é verdade. Os que me chateiam mesmo são aqueles que fazem música nem boa nem má, que se formos a ver, talvez seja ainda pior do que fazer música terrível. Os que me calharam têm sempre aquela atitude de falsa modéstia/rock star do bairro que não se leva muito a sério mas julga que é o maior porque toca umas notinhas que o levam a dar umas voltinhas por aí. Ilra!

Dito isto, acho que a raça dos músicos devia ser estudada pela Antropologia. Até participo indicando algumas possíveis denominações.

1. Rockdofodidolopiteco - homem algo rude e corpolento, na maior parte das vezes com uma pança de cerveja, que faz música tida metaleira. Veste-se de preto e por vezes ganga. Também é comum a chamada guedelha, com entradas porque já estão bem metidos nos trintas e quarentas. Responde às perguntas com pelo menos um terço de interjeições incompreensíveis. Sempre, mas sempre, faz o melhor Rock N' Roll que alguma vez existiu na história. Pouca gente sabe disto, mas chora que nem um bébe cada vez que vê o "Diário da Nossa Paixão".

2. Rockalgoroto-magnon - miúdos que começaram a fazer música aos seis anos cientes que os Linkin Park são a, a melhor banda de sempre. Hoje, nos vintes, vestem-se de preto, com riscas, afirmam que os Linkin Park equivalem a cóco e são quase todos EMO ( leia-se, sou parvo/a, mesmo estúpido, não tenho ideais de vida além de estar e ser triste e gosto de rock roto, cantado por miúdos que ainda não mudaram a voz). Não respondem a perguntas sobre os álbuns que não sejam o que acabaram de editar porque já passou muito tempo e eles já não são os mesmos que eram. Tipo há seis meses atrás.

3. Homem de Indiedertal - estes dividem-se em duas espécies: independentes e alternativos. Não permitem confusões uns entre os outros, apesar de falarem a mesma língua e viverem na mesma área. O guro dos independentes é um tipo chamado Trent Reznor. Já o dos alternativos varia conforme as estações do ano, entre os deuses Pixies, Nirvana, Radiohead e Sonic Youth. Usam ténis estragados que lhes custaram uma nota preta já estragados. As calças estão sempre bem abaixo do nível da cintura. Por vezes, são vistos a usar barrete. Falam baixo e sempre a olhar para o infinito. Não se chateiam se a sua música vende pouco, porque foi feita para ser ouvida precisamente apenas por dois ou três gajos.

4. Poperectus - estes tipos ou tipas são geralmente gente muito contente com a vida. A falta de talento sai-lhes pelos poros mas não se importam com isso. Normalmente também não dizem nada de jeito, mas estão sempre nas notícias. Tendencialmente até são bonitos e bonitas, lá por baixo das camadas de tratamento. Não de roupa, que no geral é pouca e arejada. São de forma natural os que vendem mais.

5. Folkanthropus - também divididos em duas correntes, os borings e os muito borings, estes defensores da simplicidade usam a guitarra como cama e a voz como barbitúrico. Gente poeta pois claro, nem eles próprios conseguem explicar a tendência para o falsete nos homens e para a voz grossa nas mulheres. Correm rumores da existência de alguma endogamia o que talvez explique o fenómeno. Em tempos expulsaram com certa agressividade verbal, chegaram a ouvir-se uns «Vai-te embora oh malandro», todos os descendentes da troca do cruzamento entre uma folkie e um banjo, o que deu origem à espécie seguinte.

6. Australocountrycos - descendentes dos Folkanthropus e dos banjos do Wyoming, esta é a espécie mais comunitária de todas as faladas. Fazem tudo em colectivo. Dançam coordenados em linha. Apresentam-se em bandas apenas com familiares. São uma pequena aldeia, pelo menos, em palco e raras vezes cantam sozinhos. Vestem animais mortos e usam sempre chapéu e botas, mesmo enquanto se reproduzem.

7. Hiphopilecos - de tez normalmente escura, estes amigos falam sempre em rima e com palavrões. As mulheres têm sempre rabos do tamanho de pequenos planetas e gostam de se roçar em carros de luxo. Os homens usam correntes de ouro, brincos e têm má higiéne dental. A roupa nas fêmeas está sempre dois números abaixo, nos machos uns três acima. Apesar de não usarem um único instrumento real, vendem às carradas. Deve ser por causa dos palavrões.

2 Comments:

Blogger nuska said...

Só faltam mesmo os Electroniendertal e os Jazzopitecos. Alguns deles até se fundem e dizem-se pertencentes ao grupo dos outros, ao bom estilo do darwinismo musical.

13:40  
Blogger Musicology said...

Faço minhas as tuas palavras! Perfeito! :) Estavas para lá de inspirada...um nadita caustica também :)

19:47  

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